sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Salvos para matar

Nos últimos anos, o País tem sido assolado por uma onda de pesca nociva, que vem ameaçando a vida da população marinha. A razão principal desta chacina marinha, prende-se ao facto de as comunidades vítimas de malária, beneficiarem dum gesto socialmente humanitário do governo no âmbito da sua campanha de distribuição de redes mosquiteiras. Esse grupo alvo, por uma questão de luta pela sobrevivência no mar, usa as mesmas redes para a pesca que é considerada nociva.
A par disso, a malária continua sendo o principal desafio para a saúde pública e para o desenvolvimento sustentável em Moçambique. Com base nos dados dos últimos cinco anos do sistema de vigilância epidemiológica – BES (Boletim Epidemiológico Semanal), a malária conta com uma média de 5,8 milhões de casos diagnosticados clinicamente por ano, sendo a principal razão de consulta externa (44%) e de internamento no serviço de pediatria (57%).
Exemplos para ilustrar a devastação da população marinha não faltam:
A pesca nociva no distrito de Memba, na província de Nampula, com recurso a rede mosquiteira, que contribui sobremaneira na destruição das algas e outras espécies marinhas. Os pescadores desta região, para além da rede mosquiteira, usam igualmente técnicas pouco produtivas como é o caso das gaiolas, linhas de mão e cercos.
O Arquipélago das Quirimbas em Cabo Delgado, é uma cadeia de 28 ilhas, que se estendem ao longo de quase 400 km, desde o norte da Cidade de Pemba no sul, à Cidade de Palma no norte. As espécies endémicas protegidas são várias marinhas e terrestres. As maiores ameaças ao Parque são a caça furtiva, a pesca ilegal (com redes mosquiteiras e redes de arrasto feitas de sacos de ráfia e/ou de malha fina).
Na província de Sofala, frequentemente tem se acompanhado a apreensão, de um número considerado de canoas e redes de pesca, usados por pescadores artesanais pelas razões decorrentes do uso de práticas nocivas a população marinha.
A Ilha de Chiloane, posto administrativo do mesmo nome, no distrito de Machanga, sul da província de Sofala, vive basicamente da actividade pesqueira, e se depara nesses últimos tempos com uma fraca produção, devido ao uso incisivo da rede mosquiteira na pesca.
O uso da rede mosquiteira na captura das espécies marinhas, tem consequências devastadoras a essa população, pois, arrasta consigo os ovos e apanha os peixes miúdos incluído o camarão. Quando os barcos vão para o alto mar não apanham o recurso, porque não se desenvolveu, e então voltam sem nada ou com pouco pescado. Esse facto pesa na vida do próprio pescador, criado deste modo desemprego e fome.
No entanto, o governo não tem se mostrado cego, perante a acção inconsequente dos pescadores, as autoridades recomendam o uso de redes de malha grossa, caso contrário pautam por prender as canoas e as redes de mosquiteiras desses pescadores. E recentemente no âmbito do seu programa de prevenção contra a malária, houve uma campanha de distribuição de cerca de 450 mil redes mosquiteiras que decorreu de 30 de Setembro a 4 de Outubro de 2011, abrangido 814.159 pessoas de 177.199 agregados familiares dos distritos de Palma, Nangade, Muidumbe, Mueda, Ancuabe, Namuno, Balama e Mecufi na província de Cabo Delegado.
Diante desse cenário, para um leitor desatento, estamos perante uma acção do governo que é a de distribuição de redes mosquiteiras, que devastam a população marinha. Mas para um leitor atento, estamos perante uma acção do governo tendente a salvar vidas humanas assolados pela malária, esses por sua vez usam o instrumento que lhes salvou a vida, para devastar a vida da população marinha.
Como solução, acredito que devia haver uma inteiração intersectorial, entre o Ministério da Saúde, o Ministério das Pescas e as comunidades locais, para que cada rede mosquiteira distribuída, fosse acompanhada por uma rede de pesca e, que houvesse uma fiscalização permanente nos locais onde se tem registado essa prática nociva, com o objectivo de conservação de certas areias prioritárias; promoção de pescarias legais e acima de tudo de conservação de espécies marinhas que estão em ameaça.
Pedro Munguambe
Comentários
2 Comentários

2 comentários:

  1. Muito informativo seu artigo Pedro, eu nunca tinha imaginado o quão prejudiciais eram as redes mosquiteiras para a população marinha, de tal forma, que ouvia falar de uso das mesmas na pesca, pensava apenas no risco de malária para as pessoas.
    Quanto a sua sugestão de haver inteiração intersectorial, entre o Ministério da Saúde, o Ministério das Pescas e as comunidades locais, para minimizar o problema, eu penso que não basta, dado que há casos em que algumas pessoas (não pescadores), recebem as redes e optam e vender, porque não tem o que comer. Em minha opinião, solução passa pela sensibilização da população, o que tem sido feito, e por uma presença mais forte do governo na prestação de serviços e implementação de projectos de desenvolvimento para estas populações, pois acredito, que não perpetuam estes actos por prazer, mas sim por fome. Porque é que em regiões ou distritos relativamente desenvolvidados isto não acontece?

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  2. Seu texto é muito interessante com um teor bastante informativo e sobretudo educativo. Penso que tais pessoas que dão cabo dos marinhos, pouco sabem das consequências ecológicas e mesmo sabendo podem não mudar a maneira de agir se não tiverem auxílio material, económico e ou alimentício. Defacto palestras sobre o assunto e distribuição de redes mosquiteiras e de pesca seria uma boa solução em consociação com uma fiscalização forte, abrangente e eficiente , praticamente inexistente no nosso país por "n" motivos.

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